Não pensava escrever sobre a história do cão cruzado de pitbull que matou uma criança com quem convivia habitualmente, e cujo abate friamente encarado pelo dono e pela veterinária municipal desencadeou uma onda de protestos e uma petição pública. Parece-me que deve haver atitudes diferentes perante um cão que é habitualmente agressivo e um que não o é. Mas não conheço este cão e a história parece mal contada.
Eu tive um cão indubitavelmente manso que por três vezes na vida, sem razão aparente, mordeu ou tentou morder pessoas. Como era um yorkie (não o Jr), não aconteceu nada de grave, mas demonstrou-me que os motivos e as situações que podem levar os cães a morder não são sempre evidentes para os humanos.
Em toda esta polémica o que também me chocou foi o texto de Daniel Oliveira sobre o assunto. Argumentando a favor do abate por motivos de segurança (Um animal doméstico, se se revelar perigoso para os humanos, não pode conviver com eles), o que me parece legítimo, resvala para a demagogia (as crianças não podem correr risco de vida, sejam lá qual forem os motivos) e conclui:
Resumo assim: a vida do humano mais asqueroso vale mais do que a vida do animal doméstico de que mais gostamos. Sempre.
Um resumo tonto, já que ninguém estava a discutir o valor relativo da vida de humanos e de animais. Ninguém estava a pesar as vidas do pequeno Dinis e do cão Zico, até porque matar o Zico não traz o Dinis de volta. O único a fazer essas comparações foi o próprio Daniel Oliveira, e para chegar a uma conclusão insustentável: numa escolha entre, por exemplo, o assassino de Oslo e o Zico, não me parece evidente que o humano asqueroso ganhasse.
Eu tive um cão indubitavelmente manso que por três vezes na vida, sem razão aparente, mordeu ou tentou morder pessoas. Como era um yorkie (não o Jr), não aconteceu nada de grave, mas demonstrou-me que os motivos e as situações que podem levar os cães a morder não são sempre evidentes para os humanos.
Em toda esta polémica o que também me chocou foi o texto de Daniel Oliveira sobre o assunto. Argumentando a favor do abate por motivos de segurança (Um animal doméstico, se se revelar perigoso para os humanos, não pode conviver com eles), o que me parece legítimo, resvala para a demagogia (as crianças não podem correr risco de vida, sejam lá qual forem os motivos) e conclui:
Resumo assim: a vida do humano mais asqueroso vale mais do que a vida do animal doméstico de que mais gostamos. Sempre.
Um resumo tonto, já que ninguém estava a discutir o valor relativo da vida de humanos e de animais. Ninguém estava a pesar as vidas do pequeno Dinis e do cão Zico, até porque matar o Zico não traz o Dinis de volta. O único a fazer essas comparações foi o próprio Daniel Oliveira, e para chegar a uma conclusão insustentável: numa escolha entre, por exemplo, o assassino de Oslo e o Zico, não me parece evidente que o humano asqueroso ganhasse.
12 comentários:
Nietzsche ficou transtornado mas não chicoteou o cocheiro.
E contudo o cocheiro valia menos que o cavalo.
É complicado. O que mais me custa ouvir são julgamentos fáceis, e nisso Daniel O. é especialista.
Tem toda a razão. É lamentável que se conclua como o faz D. Oliveira. Mas também não compreendo como é que tantas pessoas se mobilizam em favor do cão que mata e tão poucas se lembram da criança que morreu.
Mário, não conhecia a história do cavalo, fiquei a conhecer, obrigada.
Luisa, a criança morreu, infelizmente, e não há nada que se possa fazer em relação a isso, a não ser lá ir à rua pôr velas e flores, como quando morrem certas celebridades.
O "caso Zico" levanta pelo menos a questão da responsabilização dos donos de cães de raças potencialmente perigosas e das autoridades que se limitam a abater os cães e mais nada.
Gostei muito de ler este post, mas tenho uma ressalva quanto ao final: não podemos realmente comparar humanos e animais. A partir do momento em que eu me coloco a pergunta "salvo o asqueroso de Oslo ou o meu querido Fox?" já escorreguei para um nível perigoso na forma de olhar para os seres humanos.
"A dignidade humana é intangível" é um princípio que, neste caso, me impede de ceder à tentação de iniciar uma carreira de justiceira solitária...
Helena, sem pretender ser uma justiceira solitária, entre o teu querido Fox e o asqueroso de Oslo não tenho dúvidas sobre qual salvaria. Haveria outras escolhas capazes de me despedaçar o coração, mas essa não.
Na mouche. Mais do que esquecer a criança, como dizem acima, acho mais importante estarmos a esquecer os pais e donos do cão, porque nestes sim deve cair a responsabilização por negligenciarem criança e cão.
Como dona de um yorkie, como tu, estou bastante a salvo de magoar seriamente outros seres vivos (humanos ou não), mas não impede que se trate de um animal e, como qualquer animal, vai reagir inesperada e violentamente se não tiver sido acompanhado. Agora multipliquem isto por um cão muito mais forte que um yorkshire e é claro que será mais séria a simples e instintiva reacção a estar fechado, preso, assustado, negligenciado, às escuras e acossado (sabia lá o Zico se era uma criança ou o que era aquela «ameaça»).
Acreditem que, nas mesmas condições, não reagiriam de outra forma, porque todos somos animais e todos temos instinto de auto-preservação. Já dos paizinhos e donos que permitiram (senão incentivaram) esta situação ninguém fala, ninguém culpa, ninguém responsabiliza.
É como mandar para a sucata um carro que estivesse envolvido num atropelamento mortal.
Gi,
não vamos conseguir concordar neste ponto, mas ficamos assim: se acontecer alguma coisa horrível num sítio onde estejam o asqueroso de Oslo e o Foxinho, espero estar muito longe, e saber que tu estás lá...
;-)
Rachelet, o objectivo de muita desta discussão parece mesmo ser não deixar que, mais uma vez, se mate o cão, se desresponsabilizem os donos, e tudo fique na mesma neste país de mouros.
Helena, pode ser :-)
Ou então: que estejamos as duas: tu salvas o asqueroso e a tua consciência, e eu salvo o Foxinho :-)
(Que nunca tenhamos de fazer este tipo de escolhas - Sophie's choice)
É um assunto complicado, sobretudo se levarmos em conta a revolta natural da família das vítimas (sobretudo quando estas são crianças).
Mas a parte final do post está excelente. É isso mesmo. Excepções à parte, os cães fazem menos lam aos humanos do que estes a si mesmo.
João Afonso, quem dera que os humanos pensassem antes de escolher os cães - e antes de escolher ter cães.
E, já agora, antes de ter crianças também.
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