quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Merkel e a Madeira

Notícia do Diário de Notícias:

União Europeia
Merkel: Madeira é exemplo de má aplicação de fundos
por Lusa Ontem
A chanceler alemã, Angela Merkel, deu hoje a Madeira como um mau exemplo da aplicação dos fundos estruturais europeus, sublinhando que naquela região autónoma estas verbas "serviram para construir túneis e autoestradas, mas não para aumentar a competitividade".
Na opinião de Merkel, os referidos fundos devem servir para apoiar financeiramente as pequenas e médias empresas (...)

Não vale a pena indignarmo-nos contra Angela Merkel que, como qualquer mortal, tem apenas a informação que lhe dão. E a ela disseram, como de resto a todos nós, que a Madeira, entre túneis e buracos orçamentais, parece hoje cada vez mais um queijo Gruyère.

Julgo que a senhora Merkel nunca foi à Madeira, e decerto nunca lá foi antes de os fundos estruturais terem sido gastos em bonitos túneis e auto-estradas.

Ora o meu pai, que era engenheiro civil, esteve envolvido na construção de algumas das estradas que se fizeram na Madeira nos anos quarenta/cinquenta, e foi com essas que a Madeira se aguentou até chegarem os fundos estruturais. Essas estradas colavam-se à rocha em curvas apertadas porque não havia dinheiro nem tecnologia para fazer viadutos; os túneis eram abertos a dinamite e a picareta e a sangue de homens. A viagem do Funchal para a costa norte (28km à vol d'oiseau), de carro, demorava duas horas e meia de aflição e enjoo. Antes das estradas, as comunicações eram feitas por mar, e as populações do interior, se tivessem mesmo que vir à capital, vinham a pé ou, se doentes, de liteira.


(Madeira, 1950/51: fotos da colecção do meu pai)

Por isso: sim, houve muito dinheiro esbanjado, gastou-se como se não houvesse amanhã, há construções completamente supérfluas, houve gente a enriquecer à custa do descontrole dos dinheiros públicos (emprestados), mas como pode negar-se que aproximar as comunidades e facilitar as trocas de pessoas, mercadorias e ideias, só pode aumentar a competitividade?

Já sem discutir a natureza e benefícios da competitividade.

4 comentários:

LUIS MIGUEL CORREIA disse...

A ignorância é atrevida, por definição. Enjoei muitas vezes nessas viagens épicas do Funchal para a costa Norte, duas a três horas às curvas, na década de 1960.
Houve muito dinheiro bem gasto na Madeira e ainda bem. Ainda me lembro em 1970 ainda havia gente a viver em furnas cavadas nas rochas.
A ignorância é atrevida...

Gi disse...

Luis Miguel, das furnas não me lembro, mas lembro-me dos miúdos no campo todos ranhosos e do espanto com que viam uma abelhinha (=um táxi) chegar à vila.

George Sand disse...

Extraordinárias estas fotografias Gi.

Gi disse...

George Sand, o preto-e-branco traduz ainda melhor o que aquilo era.