sexta-feira, 8 de março de 2013

Um Holandês em Milão

Logo depois de Parsifal ver o Holandês Voador? Hmmm... Porque não? No Teatro alla Scala, no qual já tinha entrado como visitante mas nunca como espectadora, e com Bryn Terfel no papel principal, pareceu-me uma boa opção, pelo menos até ter ouvido excertos da transmissão radiofónica da estreia no blogue In Fernem Land. Talvez fosse artefacto, pensei esperançosa. E lá fui esta quarta-feira.


Esta era mais uma ópera que nunca tinha ouvido de fio a pavio, mas cuja história me era familiar. Qual não foi o meu choque ao ver o primeiro acto, em que o Holandês e Daland se conhecem quando a tempestade que irrompeu na abertura empurra os respectivos navios para um fiorde norueguês, transplantado para o escritório vitoriano do armador naval em que Daland se transformou! Contudo, de vez em quando o pessoal no escritório balançava como se estivesse num navio sob o vento gerado por uma máquina infernal que não sei onde nem para que foram desencantar. No segundo acto Senta e as amigas, em vez de rocas e fusos, tinham máquinas de escrever, o que já achei quase normal. Pelo menos não as usaram! Senta e o Holandês puderam namorar em casa dela, simbolizada por um sofá e um quadro que era realmente um écran. No terceiro acto, voltámos ao escritório do armador.
Nisto tudo, os marinheiros passaram a amanuenses, as raparigas a secretárias, só Erik conservou o estatuto de caçador, talvez porque a arma deu jeito para com ela Senta se suicidar no fim, visto que mar só nos quadros na parede. Para que conste, o encenador foi Andreas Homoki. O Scala tem produções antigas tão interessantes, não havia necessidade...

A orquestra foi dirigida por Hartmut Haenchen. Eu fiquei num camarote quase por cima dela, e gostei de observar a perfeita sincronia dos violinos. Aliás, ao contrário do que terá acontecido na estreia, não dei conta de desacertos. Assim, pude aperceber-me de algumas características desta ópera, que oscila entre o modelo italiano (os duetos, por exemplo, passariam bem por Verdi) e as frases longas e mesmo os fios condutores típicos de Wagner.

A soprano Anja Kampe como Senta foi, para mim, a melhor voz da noite, bonita e brilhante, logo seguida por Ain Anger como Daland, uma voz de baixo muito correcta e potente. Tinha curiosidade em ouvir Klaus Florian Voigt, que cantou o papel de Erik: esteve bem, não me maravilhou, achei uma voz clara mas indiferente. A grande decepção, para a qual feliz ou infelizmente já ia alertada, foi o protagonista. A voz de Terfel tem um timbre agradável, mas frequentemente foi abafada pela orquestra, e não conseguia sustentar as notas longas de Wagner, parecia uma ovelha a balir. Se agora canta assim, só lhe posso sugerir que volte a Mozart...

No final, o público, que incluía claramente muitos visitantes, aplaudiu mas também não se excedeu.

3 comentários:

Fanático_Um disse...

Vi esta encenação recentemente em Zurique e gostei bastante.

Gi disse...

Gostou, Fanático_Um? Não lhe fez confusão trazer os navios para terra firme?

Fanático_Um disse...

Gostei, Gi. Achei que a encenação resultou. A ideia dos quadros / ecrans onde o mar estava calmo, agitado ou tempestuoso consoante a narrativa pareceu-me muito conseguida. E tudo o resto também me agradou, sendo eu habitualmente avesso a encenações menos convencionais. Mas achei que esta resultou.
E em Zurique o Terfel cantou bem.