segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Máquina Infernal

Notícia de The Telegraph:

Ambrose Evans-Pritchard
Portugal next as EMU's Máquina Infernal keeps ticking
The Portuguese seemed baffled - and pained - that investors should link their country in any way with Greece or Ireland. I am afraid they must come to terms very soon with some unpleasant facts.
By Ambrose Evans-Pritchard 6:00AM GMT 22 Nov 2010
So must Europe’s leaders, who comfort themselves that Greece is a special case because it cheated, and that Ireland is a special case because it allowed its "Anglo-Saxon" banks to go berserk. They have yet to acknowledge the deeper truth that monetary union has insidiously destabilised much of Europe and trapped a ring of largely innocent countries in depression.
(...)
So with some trepidation, let me point out that Portugal will have a current account deficit of 10.3pc of GDP this year, 8.8pc in 2011, and 8.0pc in 2012, according to the OECD. That is to say, Portugal will be unable to pay its way in the world by a huge margin even after draconian austerity.
This is the worst profile in Europe.(...)
The origins of this crisis go back to Portugal’s fateful decision to push for euro membership at least 20 years before it was ready.(...)
Portugal saw its competitiveness destroyed by the boom, and has never been able to get it back. (...) It has lost swathes of low-tech industry to Chinese and East European rivals faster than it can create high-tech alternatives.
Portugal has in a sense been the victim of EMU, a casualty of ideology, wishful thinking, and untested academic theories by Nobel laureates about optimal currency unions.
(...)


É bom perceber-se que a retórica dos nossos políticos não engana quem eles julgam. Há quem saiba fazer contas. E há analistas sem papas na língua.

Evans-Pritchard termina com uma proposta que, embora já me tivesse passado pela cabeça, ainda não tinha visto escrita preto-no-branco: que em vez de serem Portugal e os restantes PIIGs a sair do euro, saia antes a Alemanha, que tem capacidade para se aguentar sozinha e até valorizar a sua moeda, enquanto talvez os países do Sul conseguissem fazer adequar o euro às suas economias mais frágeis.

5 comentários:

NanBanJin disse...

Estimada Gi:

Desta discordo.

O problema (principal) não se chama "€uro".

O problema chama-se "Made in China"... (e já agora "Made in restante-Sudeste-Asiático"... mas o primeiro é bem pior, e este seu leal leitor sabe bem do que fala, acredite.)

Ou será que as pessoas ainda não repararam nas etiquetas daquilo que compram (e já agora daquilo que 'compravam' [há pouco mais de uma década atrás])??...

É que, sejam €uros, Escudos, Yenes ou Deutsch Mark, eles não caem das árvores. Provêm (sobretudo) de bens — necessitados, produzidos, vendidos.

Simples.
Muito mais simples que tudo o mais que muito se escreve por aí.

Meus melhores cumprimentos,
Luís F. Afonso, no Japão

Gi disse...

Luís, o problema chinês é outro, um bocadinho diferente. As pessoas reparam, sim, nas etiquetas daquilo que compram, e apercebem-se da proveniência de tantas coisas, desde roupa até comida.
Mas a verdade é que é impossível competir, em matéria de preços, com a China. E acha que os desempregados europeus têm dinheiro para comprar produtos que não sejam chineses, apesar de terem sido estes que os lançaram no desemprego?

Portugal devia ter feito investimentos que nunca fez para hoje poder competir em produtos de alto valor acrescentado, sendo que o primeiro investimento devia ter sido numa educação de grande qualidade.
Temos algumas, poucas, empresas a trabalhar em produtos de alta gama, normalmente lideradas por pessoas que se formaram fora, e muitas outras desesperadas a não conseguir competir na área do baixo preço mas sem poderem dar a volta.

NanBanJin disse...

Caríssima Gi:

O número crescente de desempregados resulta em larga medida da destruição sistemática do tecido produtivo dos países (ainda) ditos 'industrializados' a que temos vindo a assistir impávidos e serenos há quase duas décadas.

Certamente há muitas outras causas para os estado de coisas a que chegámos — e eu não quero parecer (ainda que admita que o pareça com o comentário que aqui deixei acima e outros que possa fazer ou ter feito) "anti-Chinês primário", não é de modo algum isso que está em causa.

Mas quando a Gi me pergunta se os desempregados — e já agora porque não os comuns mortais que ainda têm trabalho? — podem comprar outros produtos que não os "made in China", o que eu digo é isto: se prestarmos bem atenção à variação quer de custos de produção quer de preços é inegável que produto oriundo da nova "fábrica do Mundo" como já lhe chamam é concebido por valores incomparavelmente mais baixos que os similares produzidos 'elsewhere'. Agora, é inegável também, que a larga maioria desses produtos uma vez chegados ao mercado consumidor, 'estranhamente' (e agora, sim, tenho mesmo que ser sardónico), acabam por não variar muito de PVP daqueles feitos noutro lugar qualquer — os produtos ditos "de marca" são disso o melhor exemplo mas não são, de modo algum, únicos... — o que constitui um sinal claríssimo de que os novos "negócios da China" são simples e essencialmente produto da mais abjecta e desumana exploração da mão-de-obra virtualmente escrava de que o país em causa é pródigo na oferta, e a que todos sem excepção, fechamos os olhos, e a qual colhe a nossa a nossa envergonhada e calada cumplicidade, a cada dia que passa mais resignada!

E quem beneficia verdadeiramente desta realidade? Vale a pena perguntar? Vale sim, pois claro!: os únicos a beneficiar desta situação são os detentores dos meios de produção, os investidores do capital em causa, e a própria R.P.C. que equivale a dizer o seu regime fascista travestido de vermelho.

E o consumidor? O consumidor obviamente aceita o que quer que seja que lhe ponham na montra e o seduza pelo preço que for pedido, essa é que é a verdade. A verificação da proveniência do produto é feita quase sempre pós-compra, como bem sabemos, excepção feita aos que verdadeiramente se revoltam contra este estado de coisas, e poder-lhe-ia dar inúmeros exemplos, sobretudo de bens de uso que entram pelas nossas vidas a dentro todos os dias, e nos quais podemos perfeitamente fazer esta constatação dos factos.

Meus mais amigáveis e respeitos cumprimentos,
deste seu dedicado leitor,
Luís F. Afonso, NBJ, no Japão

Gi disse...

Luís, mais uma vez me parece que o seu comentário trata de coisas diferentes.

Há dois tipos de produtos chineses a invadir o Ocidente:

os produtos de marca, resultado do investimento das companhias ocidentais na China e na sua mão-de-obra de baixo preço mas que chegam cá a preços elevados correspondendo à capacidade de marketing dessas companhias;

os produtos de fraca qualidade, a preços tão baixos que não se percebe como são possíveis - mesmo intuindo quanto ganham os trabalhadores chineses, há os transportes e os intermediários todos - e que são aqueles que a população em geral compra e de que eu falava no comentário anterior.

Quanto ao restante: é sabido que a mão-de-obra chinesa é praticamente escrava (embora já vá havendo algumas revoltas e não abona nada em relação ao Ocidente que se aproveite disso, mas no mundo super competitivo e agressivo actual não parece haver alternativas viáveis. O comércio justo ainda me parece muito pouco justo.

Ou mudamos inteiramente de sistema económico e social global, ou não há volta a dar: de qualquer maneira, espera-nos muito sofrimento.

NanBanJin disse...

Estimada Gi:

Não quero de modo algum ser maçador, e admito que trouxe à baila um tema aparentemente distante daquele de que trata o post. Não irei insistir no meu ponto vista, não obstante este ser um tema que poderíamos e seria positivo debater por muitos dias e mediante longa escrita.

Agradeço-lhe a referência que deixou neste seu último comentário a certas situações tumultuosas verificadas na China recentemente — realidade da qual, é facto, já me havia inteirado através dos meios de comunicação social do país que me acolhe, onde este tema é debatido à luz de uma sensibilidade muito particular, assaz diferente, assim me parece, da que dita os termos de análise do mesmo na nossa Europa.
A esse respeito só tenho um comentário a fazer: as situações verificadas na China no Verão passado não sendo de subestimar, não afectam minimamente as regras do jogo, porque num país onde não existe liberdade de expressão, de imprensa, de associação e de filiação sindical, e onde o poder vigente não hesita dois minutos em enviar forças militares de colossal envergadura e armadas até aos dentes para esmagar o mínimo ensejo de revolta, sem que seja quem for, dentro ou fora de portas, levante voz que se faça ouvir alto e bom som, esse país não irá mudar um milímetro na sua posição durante muito tempo.

Muito resumidamente, pretendia só dizer que acredito que uma Europa a uma só voz e de moeda única poderia ter viabilidade, mesmo com pequenas economias menos industrializadas que as suas congéneres de maior peso, caso fosse possível proteger o respectivo tecido produtivo — o que não acontece, e receio a cada dia que passa mais que seja já demasiado tarde para salvar o que nos resta.

Queira a perdoar a minha persistência em usar este seu espaço de comentários. Não irei abusar do meu direito de réplica. Satisfaço-me em reconhecer que compreende o meu ponto de vista.

Uma vez mais, o meu mais sincero agradecimento,

Luís Filipe Afonso