domingo, 20 de novembro de 2011

Satyagraha

Note: text in English added after the video

Em primeiro lugar, sou admiradora de Gandhi: mais, acho que o inventor da resistência pacífica e da desobediência civil é a grande figura política do século XX.
Em segundo lugar, gosto da música de Phillip Glass, em particular do concerto para violino e de várias peças para piano.
Em terceiro lugar, assisti na última temporada à transmissão de Nixon in China, de John Adams, outro autor da mesma escola, e achei interessante.
E então?
Então fui toda animada no sábado à Gulbenkian ver a transmissão MetLive HD de Satyagraha, e saí aos cinquenta minutos.

Há artistas que não sabem colocar-se ao alcance do ouvido (a frase é de Nietzsche). Ou não querem, e Glass deve ser um deles.

O libretto é em sânscrito, uma língua tão "popular" como o grego antigo, o latim ou o aramaico, e ao contrário por exemplo do filme The Passion of the Christ de Mel Gibson, não há legendas, embora sejam projectadas de vez em quando umas frases panfletárias em inglês, cuja autoria desconheço; a encenação de Phelim McDermott, estreada em 2008, enquadra-se no género simbólico/mágico e com esses condicionantes é complicado perceber o que se está a passar no palco. Mas enfim, havia o programa de sala com a sinopse, e antigamente também não havia legendas nos teatros de ópera.

Gostei das vozes, tanto do tenor Richard Croft (Gandhi) como do baixo-barítono Bradley Garvin (Arjuna).
Porém tudo rapidamente se tornou entediante.

A música de Glass é repetitiva, hipnótica, com pequenas variações harmónicas: eu sei e gosto. Mas o tratamento das partes vocais tem de ser diferente, senão o que é fascinante durante alguns minutos torna-se uma lenga-lenga insuportável. Talvez uma realização cinematográfica inspirada salvasse a situação, mas não a houve. Na esperança que depois do prólogo a coisa ficasse mais animada, deixei-me estar à espera... mas tal não aconteceu, pelo contrário.

A verdade é que para fretes bastam aqueles a que sou obrigada. Não aguentei. Tenho pena.



I really am a fan of Gandhi's: I actually think that the inventor of non-violent resistance and civil disobedience is the great political figure of the XX century.
I also really like Phillip Glass's music, particularly the violin concerto and several piano pieces.
And last season I watched the broadcast of John Adams's Nixon in China, Adams being another author from the same school, and I found it interesting.
So?
So last Saturday I happily went to Gulbenkian's auditorium to watch the MetLive HD broadcast of Satyagraha, and left after fifty minutes. 


Some artists won't make it easy for their audience, and I guess Glass is one of them.

The libretto is in Sanskrit, a language as "popular" as ancient Greek, or Latin, or Aramaic, but unlike Mel Gibson's movie The Passion of the Christ there are no subtitles, only sometimes a few projected panflet-like sentences in english; I have no idea who wrote them. Phelim McDermott's production, premiered in 2008, can be described as symbolic/magical so understanding what is going on on stage gets difficult. Still, there was a program with a synopsis, and time was when there were no subtitles at all in opera houses.

I liked the voices, both tenor Richard Croft (Gandhi) and bass-baritone Bradley Garvin's (Arjuna).
Nevertheless everything quickly became tedious.

Glass's music is repetitive and hypnotic, with small harmonic variations: I know that and I enjoy it. But the vocal parts must have a different treatment, otherwise what is fascinating for some minutes becomes unbearable. An inspired cinematic direction might perhaps save the situation, but there was none such. In the hope that after the prologue things would liven up I stayed on... but it didn't happen, on the contrary.

There are of course many situations I have to endure, but I could walk out of this one, so I did. Sorry.

10 comentários:

FanaticoUm disse...

Somos dois! Estou totalmente de acordo consigo Gi. Brevemente colocarei no nosso blog umas linhas sobre este espectáculo, mas também para mim foi muito penoso. E, como sugere, para penoso já basta o que não conseguimos evitar.

Moura Aveirense disse...

Ui...

Mário R. Gonçalves disse...

Como a compreendo, Gi.

As "últimas" de Steve Reich também são uma seca monumental.

Paulo disse...

Não pude ir ao Met, mas li a opinião do Joaquim e ele pareceu-me entusiasmado. De maneiras que não sei.

Gi disse...

FanaticoUm, ficou até ao fim? Tenho algum medo, às vezes, que as coisas melhorem muito depois da minha saída.

Moura, pois.

Mário, de Steve Reich não conheço nada. Ouvindo outra vez Satyagraha aos bocadinhos, acho bonito, mas tudo seguido...

Paulo, também li a opinião do Joaquim, e há muitos comentários positivos no Youtube, por exemplo. É certamente o tipo de coisa para a qual tem se se estar com uma disposição especial.

wagner_fanatic disse...

Também saí ao intervalo... Acho que a tradução desta ópera em Português, como eu e o FanaticoUm acordamos, será de "Chateabrava"...

Gi disse...

Wagner_fanatic, a tradução não podia ser melhor, LOL.

FanaticoUm disse...

O texo em inglês está óptimo, aliás como o em português. Revi-me nele. Gostaria de ser capaz de escrever assim...
Mas, respondendo à sua pergunta, também eu não aguentei até ao fim!
A música é, para mim, uma das maiores fontes de prazer. Mas se o não sentir e, pelo contrário, me incomodar, já não me "torturo", ao contrário do que aconteceu durante muitos anos.
Pensei que não estava preparado para certo tipo de música por falta de formação. Hoje já não ten ho esses perconceitos. Se não gosto, evito.

Fernando Vasconcelos disse...

Oh Gi e eu a pensar que era o único que não tinha paciência para algumas obras digamos ... contemporâneas ... Não fui mas provavelmente teria ficado até ao fim não para me torturar mas para tentar "interiorizar", a esperança da revelação é a ultima a morrer! De resto de acordo quanto a Ghandi e ao concerto para violino de Glass, também gosto muito. Esta ópera é dose ...

Gi disse...

FanaticoUm, obrigada pelo elogio :-)
Uma das vantagens da passagem dos anos e do ganho em experiência é precisamente, acho eu, podermos deixar a meio o que, não sendo importante, não nos agrada.

Fernando, parece-me que a arte contemporânea muitas vezes se perde em teorias, embora também haja, claro, obras-primas a ilustrar conceitos teóricos.