Já se sabem os resultados da votação da Proposta nº8 na Califórnia, que visava revogar a lei que permitia o casamento entre pessoas do mesmo sexo naquele Estado. A maioria votou sim. Pode parecer estranho, mas não esqueçamos que se há Estado cheio de contradições é a Califórnia, cujo governador é o Republicano conservador Arnold Schwarzenegger.
Os apoiantes da Proposta nº8 tinham a mesma visão do casamento de Manuela Ferreira Leite: é um compromisso entre um homem e uma mulher para a produção de filhos. E mais nada.
Ora mesmo se historicamente essa definição tem sido usada, o casamento está longe de ser só isso, ou mesmo de ser isso: quantos homens e mulheres se casam sem intenção, ou sem possibilidade, de ter filhos? Alguém já se lembrou de proibir o casamento entre pessoas de mais de cinquenta anos?
E, já agora, que impede, a não ser eventualmente a lei, um casal gay de ter filhos, próprios ou adoptados? E para os que se arrepiam com a ideia: não será muito melhor para uma criança viver numa família estável e afectuosa com dois pais ou duas mães do que numa família disfuncional ou numa instituição de acolhimento?
Quanto à possibilidade de uma criança educada por um casal gay se tornar também gay, isso é grave? Além de que seria interessante que os tais que se arrepiam explicassem, nessa perspectiva, como se tornam gay as crianças educadas por casais hetero.
Na verdade, o casamento talvez devesse definir-se como um contrato reconhecido por um grupo social ou religioso que envolve duas pessoas que prometem partilhar experiências de vida, incluindo normalmente afecto e sexo, e pretendem proteger determinados direitos sociais ou económicos.
Isto, julgo eu, incluiria os casamentos por amor, as alianças familiares, os casamentos por puro interesse material, quer entre pessoas do mesmo sexo quer não.
E se me disserem que estamos a quebrar uma tradição histórica, respondo: e porque não? A luta contra a desigualdade é relativamente recente, e a nossa noção do que constitui desigualdade tem mudado desde que os Founding Fathers redigiram a Declaração de Independência, sem lhes passar pela cabeça o paradoxo de a igualdade que lhes parecia evidente não se aplicar aos seus escravos.
Os apoiantes da Proposta nº8 tinham a mesma visão do casamento de Manuela Ferreira Leite: é um compromisso entre um homem e uma mulher para a produção de filhos. E mais nada.
Ora mesmo se historicamente essa definição tem sido usada, o casamento está longe de ser só isso, ou mesmo de ser isso: quantos homens e mulheres se casam sem intenção, ou sem possibilidade, de ter filhos? Alguém já se lembrou de proibir o casamento entre pessoas de mais de cinquenta anos?
E, já agora, que impede, a não ser eventualmente a lei, um casal gay de ter filhos, próprios ou adoptados? E para os que se arrepiam com a ideia: não será muito melhor para uma criança viver numa família estável e afectuosa com dois pais ou duas mães do que numa família disfuncional ou numa instituição de acolhimento?
Quanto à possibilidade de uma criança educada por um casal gay se tornar também gay, isso é grave? Além de que seria interessante que os tais que se arrepiam explicassem, nessa perspectiva, como se tornam gay as crianças educadas por casais hetero.
Na verdade, o casamento talvez devesse definir-se como um contrato reconhecido por um grupo social ou religioso que envolve duas pessoas que prometem partilhar experiências de vida, incluindo normalmente afecto e sexo, e pretendem proteger determinados direitos sociais ou económicos.
Isto, julgo eu, incluiria os casamentos por amor, as alianças familiares, os casamentos por puro interesse material, quer entre pessoas do mesmo sexo quer não.
E se me disserem que estamos a quebrar uma tradição histórica, respondo: e porque não? A luta contra a desigualdade é relativamente recente, e a nossa noção do que constitui desigualdade tem mudado desde que os Founding Fathers redigiram a Declaração de Independência, sem lhes passar pela cabeça o paradoxo de a igualdade que lhes parecia evidente não se aplicar aos seus escravos.
7 comentários:
Olá Gi,
Este tema,(o casamento gay), não devia ser tema. E só o é por intolerância de alguns. Porque o casamento é e sempre foi um contrato para dar estabilidade a uma relação. Antes de tudo a uma relação de amor, mas também de amizade ou mesmo a uma aliança económica ou politica. A procriação é uma consequência da relação entre 2 pessoas mas não necessariamente do casamento. Porque há muita gente com filhos sem serem casados e muitos casados sem filhos. Quer por opção, quer por defeito do equipamento quer por estarem fora do prazo de validade.Não se fale portanto da procriação como a justificação do casamento. Não sendo esta a justificação não há qualquer motivo para se ser contra o casamento gay excepto por intolerância e preconceito. É escandaloso como existem pessoas que acham que podem impor aos outros as suas ideias e valores.
Eu sou hetero. O casamento é um acto de liberdade entre duas pessoas. Da mesma maneira que ninguem me pode obrigar a casar com um homem eu não tenho o direito de intreferir no casamento entre 2 homens ou duas mulheres. Da mesma maneira que os sócios do Sporting não devem intreferir nas Assembleias Gerais do Benfica. Porque não lhes dizem respeito. E porque esse casamento em nada me afecta eu não tenho sequer o direito de me pronunciar. Porque eu sou do Sporting e eles são do Benfica. Independentemente da minha opinião sobre o casamento homosexual. Mais do que a minha opinião, deve prevalecer o principio do respeito pelas outras pessoas.
A votação foi muito curiosa: ao que parece, o voto dos afro-americanos e dos latino-americanos foi maioritariamente a favor da Proposta nº 8, donde se poderá deduzir que, apesar de terem sido (e não continuarão a ser, apesar da vitória de Obama?) segregados ao longo dos tempos, esses eleitores votam pela homofobia e pela negação de direitos aos outros. E se todas as minorias fossem votadas à perda de direitos?
E isto ainda me fez lembrar de outras hipocrisias:
a) Por cá, um casal homossexual não pode adoptar uma criança. Contudo, se uma pessoa homossexual for casada (com alguém do sexo oposto, claro está), a lei não o impede - desde que se façam bem as coisas.
b) Há alguns anos, não muitos (até já se sabia que não valia a pena continuar a considerar os chamados grupos de risco para o efeito), um homossexual que quisesse dar sangue não podia afirmar que o era durante o preenchimento do formulário. Mesmo que dissesse que tinha uma relação estável e que não tinha comportamentos de risco, a sua ficha era logo posta de lado. Poderia, no entanto, omitir a sua sexualidade. Como poderia também ser aceite o sangue de uma pessoa heterossexual que não assumisse as suas escapadelas.
António, eu também acho que permitir é diferente de obrigar e que permitir o casamento civil a pessoas do mesmo sexo não obriga ninguém.
Infelizmente isto não é necessariamente verdade porque depois aparecem as regulamentações que às vezes são mais papistas do que o papa. Assim se passou com o aborto, por exemplo, que se pretendia simplesmente descriminalizar e que passou a ter direitos especiais nos hospitais públicos, passando à frente de patologias e sendo isentado de taxas moderadoras.
Os apoiantes da Proposta nº8 receavam que por exemplo as igrejas fossem obrigadas a celebrar casamentos gay contra as suas tradições.
Sem dúvida que é escandaloso como existem pessoas que acham que podem impor aos outros as suas ideias e valores, mas quando a maioria vota contra as nossas ideias e os nossos valores, como agora aconteceu na Califórnia, o que podemos fazer senão tentar esclarecer as pessoas, explicar-lhes a nossa perspectiva, e ir chateando a ver se mudam de ideias?
E entretanto, na prática, o que fazemos: vivemos como eles querem ou como nós queremos?
Peço desculpa por esta longa resposta com tantas outras perguntas :-)
Paulo, em relação ao voto latino encontrei neste artigo do Huffington Post: We are the society, after all, that defined the word "macho." The old-school standards for strong Hispanic males include getting into brawls, avoiding the kitchen, and womanizing at will(...) Is it possible that the old boogeyman, the Catholic Church, is somewhat responsible for the invincible strain of homophobia in Latino culture? To the surprise of absolutely no one, the answer is yes.
Statistics from Hispanic Business show that 64 percent of Latino Catholics voted for the proposition. Just 10 percent of non-religious Hispanics voted the same way.
As minorias não são solidárias entre si, até porque se intersectam transversalmente. Não se pode esperar que por serem minorias os latinos votem com os negros ou estes com os homossexuais ou estes com os muçulmanos: na realidade, cada um dos grupos tenderá tanto a ver os outros como outros como as próprias maiorias.
Tem toda a razão, Gi. É isso que acontece, contra toda a (minha) lógica das ideologias. Não se pode pressupor que cada um dos candidatos consiga ser um "aglomerador" dos ideais e expectativas de um dos dois blocos (inteiro) de eleitores. Vota-se no candidato republicano ou no democrata (não há outros), mas isso não significa que se concorda em absoluto com ele. Este caso é um exemplo muito claro: temos vários extractos da população que votam no candidato que lhes oferece mais garantias, mas que só aceitam o pedacinho das propostas que lhes dizem directamente respeito. Os outros, mesmo que igualmente defendidos pelo mesmo candidato, não interessam.
Paulo, parece-me que é isso mesmo. E Obama soube ser uma espécie de catalizador de sonhos de muita gente com sonhos diferentes.
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